quarta-feira, 27 de abril de 2011

...E O PANO DA COSTA????


O Pano da Costa

Presença e distintivo do posicionamento feminino nas comunidades religiosas afro-brasileiras, o pano-da-costa, não é apenas um complemento da indumentária da mulher; é a marca do sentido religioso nas ações da mulher como iniciada ou dirigente dos terreiros, aqui no Brasil, claro.
Observemos a profunda conotação sócioreligiosa desse simples pedaço de tecido, que atua em tão diversificadas situações, desempenhando papéis dos mais significativos e necessários para a sobrevivência dos rituais africanos. O pano-da-costa é assim chamado por ter sido um tipo de tecido vindo da costa dos escravos, Costa Mina, Costa do Ouro.  O tecido original foi substituído por outros tipos de tecidos, o que não diminui em nada as funções do pano-da-costa.
O pano-da-costa identifica a mulher feita, iniciada, aqui no Brasil, mesmo que ela não esteja de roupa de santo completa. Mas na realidade, esse pano, protege as costas das mulheres, e servem de “carrega bebê”. Nada mais que isso. Aqui no Brasil acabou virando indumentária religiosa. O que não é.
A situação do pano-da-costa é de maior importância, se colocarmos a presença da mulher como símbolo do poder sócioreligioso e arquétipo dos valores mágicos da fertilidade, isso motivado pelas formas anatômicas características da mulher.




O sentido protetor do pano-da-costa é outro aspecto que merece atenção. As Yaos, ao terminar o período de feitura começam a travar seus primeiros contatos com o mundo exterior protegidas pelo pano-da-costa branco, que representa o prolongamento do Ala de Oxalá, envolvendo praticamente todo o seu corpo no grande pano-da-costa, procura manter os valores religiosos de sua feitura quando em contato com os valores profanos encontrados extramuros dos terreiros.




Nos sirruns/axexes, a mesma proteção do pano-da-costa, ateado como capa envolvente mágica, aparece guardando  as mulheres das presenças de egum.
O pano-da-costa é de uso exclusivo da mulher nos cultos africanos, porque uma das principais funções do mesmo é proteger os órgãos reprodutores das mulheres, das Yamis.
 
Nos rituais de sirrum/axexe as mulheres usam dois panos-da-costas branco: um protegendo seus ventres e outro sobre os ombros como uma capa que envolve todo o seu colo e seios.
O pano-da-costa deve ter no mínimo 60 cm de largura para que possa proteger os órgãos que necessitam de proteção.As famosas mães de santo não usam o pano-da-costa na cintura nunca.
No Rio de Janeiro e outros estados, onde a chamada evolução está destruindo e recriando situações a bel prazer, convencionou-se que o pano-da-costa deve ser usado de acordo com a idade de santo, isto é, só usa preso acima dos seios aquelas que ainda são yaos. Esta errado, pano-da-costa é para ser usado dessa forma mesmo independente da idade de feitura, quando muito, pode-se enrolar até abaixo dos seios.
De alguns anos para cá os homens aderiram o pano-da-costa, mas nenhum deles até agora explicou o porquê de usá-lo e nem podem explicar, pois o mesmo é de uso exclusivamente feminino.  E pior ainda, o usam na cintura. Para proteger o que?
Observem que as santas mulheres usam o pano-da-costa, os santos homens usam o pano-da-costa amarrados no ombro lembrando um Alaka (esse sim pertence ao homem)ou amarrado para trás, ou simplesmente ficam com o peito nu adornados pelas contas e brajas.


Em algumas casas encontramos abians usando pano da costa, esse procedimento esta errado. As abians ainda não tiveram seus pontos de energias abertos durante uma feitura, portanto as mesmas não necessitam dessa proteção ainda.



......FALANDO SOBRE O SACRIFÍCIO.....



SACRIFÍCIO NOS TEMPOS REMOTOS 

Dentre os vários assuntos já muito discutidos, temos os ritos que envolvem os sacrifícios animais praticados habitualmente em nossos Rituais. Inicialmente gostaríamos de relatar que presenciamos regularmente em uma avícola o absurdo que é praticado para matar as "galinhas" que são consumidas com a maior naturalidade e desrespeito pelos clientes assíduos daquele comércio. Existem naquele local alguns cones de aço inox, posicionados em fila indiana, sobre um aparador também de aço inox. No pescoço das aves, próximo à cabeça, é feito um corte com faca e o animal é enfiado de cabeça para baixo no cone, onde se debaterá por vários minutos até que todo o seu sangue tenha escorrido para dentro do "aparador", provocando-lhe a morte. A população não vê esse método de abate como "aterrorizante", provocando extremo sofrimento aos animais até que cheguem à morte. Excluídas as vezes em que a grande clientela não deseja esperar muito tempo e os animais são colocados, ainda vivos, em um caldeirão com água fervente a fim de que lhe sejam extraídas as penas mais rapidamente. Este é um aspecto "comercial" onde poucos sentem dó ou reclamam desta forma ainda medieval, portanto cruel, de abate em avícolas.



Os Cristãos, Católicos e Protestantes, são os que mais repudiam o nosso sacrifício animal. Eles deveriam estudar mais o seu Antigo Testamento, em específico o "Levítico", onde os sacrifícios, não só de animais, são relatados.O livro de Levítico é o código das leis dadas por Deus a seu povo através de Moisés no Sinai. "As cerimônias e outros ritos e normas não eram um fim em si mesmas. A oferta do sacrifício dia após dia, ano após ano, a recordação anual do dia da expiação recordavam constantemente a Israel o pecado que o separava da presença de Deus. Os israelitas infringiam a aliança com ele desobedecendo as suas leis e estavam condenados à morte. Mas Deus, na sua misericórdia, mostrou-lhes que haveria de aceitar um sucedâneo, a saber, a morte de um animal perfeito e inocente em lugar da vida do pecador. Suas leis mostram que Deus age em harmonia com as leis naturais para o bem do povo.", escreve o autor.

Levítico 1-7 – Os Sacrifícios
1 - O Holocausto (capítulo 1 e 6,1-6) único sacrifício em que se queima o animal todo, um sinal de consagração.
2 - Ofertas de cereais ou de farinhas (capítulo 2 e 6, 7-11) acompanhavam muitas vezes o holocausto e o sacrifício de comunhão (item 1 acima).
3 - O sacrifício da comunhão (capítulo 3 e 7, 11-36)
4 - O sacrifício do pecado (4,1-5,13 e 6, 17-23)
5 – O sacrifício da reparação (5,14-26 e 7, 1-10)


O Fiel trazia sua oferta (um animal sem defeito físico tirado da própria manada ou rebanho ou, no caso do povo pobre, rolas ou pombos) até o pátio diante do tabernáculo.
Colocava a mão sobre ele para significar que o animal o representava e depois o imolava (sacrificava). Se o sacrifício era público o Sacerdote era quem realizava essa operação. O Sacerdote tomava a bacia com o sangue e com ele espargia no altar, queimando a seguir algumas partes específicas do animal que continham determinadas porções de gordura. O que restava era consumido pelos Sacerdotes e suas famílias ou ainda pelo Sacerdote junto com os ofertantes.

Os sacrifícios exprimiam a gratidão do indivíduo pela bondade de Deus, ou eram simplesmente manifestações espontâneas de devoção e homenagem. O sacrifício pelo pecado e o sacrifício da reparação (Levítico 4-5, 26) referem-se às transgressões contra a lei de Deus ou situação em que foi cometida uma falta contra o próximo, porém ambos demonstram a exigência de enfrentar o pecado pelo uso do sangue.
O Sacerdote como representante de Deus tinha a função de declarar se o fiel e sua oferta eram aceitos ou rejeitados por Deus.

A prática do sacrifício animal remonta ao início das relações entre Deus e os homens (Gênesis 4,4) e no Novo Testamento explica a morte de Jesus (Hebreus 9,11). O Levítico 17,11 diz que o sacrifício é algo dado por Deus ao Homem. A pessoa que leva a oferta apodera-se da vida do sangue animal sacrificado e pode doá-la a Deus, injetando nova vida nas suas relações com Deus, revitalizando o seu dia a dia.
Por que devemos ficar aqui citando longamente as Escrituras Sagradas Judaicas e Cristãs se nosso objetivo é a Religião  do Òrìsà?


Este é um pequeno espaço para a dignificação da Religião  do Òrìsà, tão agredida pelas Doutrinas Cristãs, principalmente pelos Protestantes. Então, cabe-nos o direito de mostrar quão hipócritas são aqueles que nos agridem e nos repudiam com bases em seus Livros Sagrados, que mostram largamente a pratica de ritos idênticos aos nossos e com a mesma simbologia.

Então dirão os Umbandistas assim como os Cristãos:
_ Nós abolimos esses ritos!
E respondemos à altura:
_ A Religião de Òrìsà é extremamente tradicionalista e não muda sua liturgia com fins hipócritas, somente para agradar a visão leiga dos fiéis na tentativa de obter fins lucrativos. O que era feito há 10.000 anos é mantido até hoje por nós, mas não com uma conotação diabólica como desejam nos impor usando uma mídia já desgastada. Hoje o Homem é culto, busca se informar e encontrará a verdade relativa ao nosso mundo religioso. O culto de Òrìsà nunca esteve envolto ao mundo da Magia Negra, ao baixo astral, ao Satanismo ou muito menos ligado aos demônios somente porque realizamos em nossos ritos o sacrifício animal.
Nós pregamos os ensinamentos de orisá que são puros em sua essência, não ficamos pregando mais os atos dos demônios do que a palavra de Deus tirada de livros sagrados de autoria duvidosa. Nossa doutrina religiosa foi mantida pela boa vontade do Homem fiel e temente a Deus, mantendo todos os nossos conhecimentos na memória e transmitindo-os pela oralidade  ancestrais através das lendas[itans]
Não temos livros sagrados adaptados a cada momento da história em decorrência das necessidades das instituições religiosas. Não expulsamos demônios em forma de "teatro" para enganar pobres coitados crédulos dizimistas que acreditam nas encenações de atores bem pagos para se contorcerem em público ou darem testemunhos suspeitos, sempre idênticos, sem provas. Não "amarramos" espíritos ruins em nome de Deus. O que desejamos é somente poder expor que nossa Religião, a Religião de Òrìsà, tem como objetivo Re-ligar o Homem a Deus através da manutenção de ritos tradicionalistas; através de uma hierarquia rígida mantida entre os seguidores e Iniciados; através da exigência de uma conduta honrada e moral dentro das verdadeiras casas de candomblé . Desejamos mostrar com clareza que nossos verdadeiros Sacerdotes e sacerdotizas são homens  e mulheres sábios, estudiosos e perseverantes na sua religiosidade, tudo isso com base em uma filosofia mitológica milenar. Qualquer outra versão não tem sustentação real, tratando-se de invencionismo de muitos que pretendem impressionar ou lucrar em benefício próprio usando o nome dos Òrìsà.


Se fazemos sacrifícios é porque somos autorizados por Deus, conforme também era praticado em Israel. Não podemos esquecer que nas mesquitas, anualmente, até os nossos dias, é sacrificado um cordeiro para Alláh (Deus). Mas ninguém pode de agredir o Islã. E sabemos muito bem o porquê! Èjè (sangue) é vida, todos nós aprendemos isso nos  terreiros verdadeiramente consagrados aos Òrìsà. Tiradas as partes sagradas dos animais que são ofertadas às Divindades, o restante é consumido pelos ofertantes. Não há desperdício nas Ilé Òrìsà, em respeito à natureza, conforme nos determinam as Divindades. Os animais ofertados não podem sofrer ao serem imolados, conforme nos determina o Òrìsà Ògún Olóòbe, a Força proprietária da Faca.
O ritual é cercado do máximo respeito seguido de procedimentos de abstinência, onde a pureza e a limpeza espiritual e orgânica dos presentes é exigida com rigor para que eles possam participar desse tipo de oferenda e só aos Iniciados devidamente preparados por anos, cabe exercer o ato de imolar o animal. Isso não cabe a qualquer pessoa despreparada. Há uma liturgia a ser seguida a risca em detalhes, onde o omi (a água), epo pupa (azeite de dendê), wuara (o leite), oyin (o mel), iyò (o sal), otí (a aguardente), ataare (a pimenta) são orados e encantados recebendo pela palavra propriedades mágicas, para poderem ser ofertados às Divindades como símbolos de doçura, progresso, prosperidade, fartura, fertilidade, alegrias e paz afim de que essas bênçãos sejam retribuídas a todos em troca da oferta. Sem que nunca se esqueça de ofertar para ONÍLÈ (a terra) sua parte, pois é ela quem sustenta os nossos pés.
Esta frase metafórica  nos ensina que é a Mãe Natureza quem nos permite mais uma reencarnação na Àiyé (na Terra) e por isso devemos mostrar nossa gratidão a ela durante os ritos de oferendas. Só pode ver maldade em uma ritualística dessa quem é mal no mais profundo de sua essência intima, no próprio caráter ou pelo desconhecimento, acabando por julgar sem saber o que verdadeiramente está sendo realizado num ritual em nome de Deus.
Pois graças a esse Deus universal, Elédùmarè nós não fazemos apologia aos demônios, pois os desconhecemos na nossa cultura religiosa. Para a Cultura Religiosa Yorùbá Deus não "permitiria que os Anjos Caíssem".

QUEM FAZ MAL AOS HOMENS É O PRÓPRIO HOMEM!

A Religião Animista Òrìsà não deseja ser melhor que as outras Religiões. Deseja somente ser respeitada, assim como sabe respeitar. Desejamos somente que as pessoas possam cumprir seu papel em mais uma passagem pela Vida no Àiyé com auxílio dos ensinamentos dos nossos mais velhos. Desejamos somente crescer nas experiências de viver. Desejamos poder aprender a conviver num mesmo espaço físico com os outros homens, porque o nosso espírito não tem para onde evoluir já que o Homem é um Deus-finito. Evoluir o espírito do Homem seria tentar superar a Deus, pois o nosso espírito foi criado de Deus, portanto somos partículas divinas. Já fomos criados sendo deuses. Tudo o que necessitamos já recebemos de Deus no momento da 
Criação, só temos que aprender a usar o que nos foi dado por Ele.



....OS GÊMEOS QUE FIZERAM A MORTE DANÇAR!!!











OS GÊMEOS QUE FIZERAM A MORTE DANÇAR



        Na velha aldeia de Ifá tudo transcorria normalmente.
        Todos faziam seu trabalho,
        as lavouras davam seus bons frutos,
        os animais procriavam,
        crianças nasciam fortes e saudáveis.
        Mas um dia
        a Morte resolveu concentrar ali sua colheita.
        Aí tudo começou a dar errado.
        As lavouras ficaram inférteis,
        as fontes e correntes de água secaram,
        o gado e tudo o que era bicho de criação definharam.
        Já não havia o que comer e beber.
        No desespero da difícil sobrevivência,
        as pessoas se agrediam umas às outras,
        ninguém se entendia, tudo virava uma guerra.
        As pessoas começaram a morrer aos montes.
        Instalada ali no povoado, a Morte vivia rondando todos,
        especialmente as pessoas fracas, velhas e doentes.
        A Morte roubava essas pessoas e as levava para o outro mundo,
        longe da família e dos amigos.
        A Morte tirava a vida delas.
        Na aldeia morria-se de todas as causas possíveis:
        de doença, de velhice, e até mesmo ao nascer.
        Morria-se afogado, envenenado, enfeitiçado.
        Morria-se por causa de acidentes,
        maus-tratos e violência.
        Morria-se de fome, principalmente de fome.
        Mas também de tristeza, de saudade
        e até de amor.
        A Morte estava fazendo o seu grande banquete.
        Havia luto em todas as casas.
        Todas as famílias choravam seus mortos.

        O rei mandou muitos emissários falar com a malvada,
        mas a Morte sempre respondia que não fazia acordos.
        Que ia destruir um por um, sem piedade.
        Se alguém fosse forte o suficiente para enfrentá-la, que tentasse,
        mas seu fim seria ainda muito mais sofrido e penoso.
        Ela mandou dizer ao rei, por fim:
        "Para não dizerem que sou muito rabugenta,
        até concordo em dar uma chance à aldeia."
        E ria e escarrava ao mesmo tempo, dizendo:
        "Basta que uma pessoa me obrigue a fazer o que não quero.
        Se alguém aqui me fizer agir contra a minha vontade,
        eu irei embora."
        Depois, cuspindo nos seus interlocutores, completou:
        "Ma só vou dar essa oportunidade a uma única pessoa.
        Não vou dar nem a duas, nem a três."
        E foi-se embora dali,
        saboreando antecipadamente mais uma vitória.

        Mas quem se atreveria a enfrentar a Morte?
        Quem, se os mais bravos guerreiros estavam mortos
        ou ardiam de febre em suas últimas horas de vida?
        Quem, se os mais astutos diplomatas havia muito tinham partido?


        

Foi então que dois meninos, os IBEJIS,
        os irmãos gêmeos 
TAIÓ e CAIANDÊ,
        que os fofoqueiros da cidade diziam ser filhos de Osun com orunmilá,
        resolveram pregar uma peça na horrenda criatura.
        Antes que toda a aldeia fosse completamente dizimada,
        eles resolveram dar um basta aos ataques da Morte.
        Decidiram os 
IBEJIS:
        "Vamos dar um chega-pra-lá nessa fedorenta figura."
        Os meninos pegaram o tambor mágico, que tocavam como ninguém,
        e saíram à procura da Morte.
        Não foi difícil achá-la numa estrada próxima,
        por onde ela perambulava em busca de mais vítimas.
        Sua presença era anunciada, do alto, por um bando de urubus
        que sobrevoavam a incrível peçonhenta.
        E o cheiro, ah, o cheiro!
        A fedentina que a Morte produzia à sua volta
        faria vomitar até uma estatueta de madeira.
        Os meninos se esconderam numa moita
        e, tapando o nariz com um lenço,
        esperaram que ela se aproximasse.
        Não tardou e a Morte foi chegando.
        Os irmãos tremeram da cabeça aos pés.
        Ainda escondidos na moita,
        só de olhar para ela sentiram
        como os pêlos dos seus braços se arrepiavam.
        A pele era branca, fria e escamosa;
        o cabelo, sem cor, desgrenhado e quebradiço.
        Sua boca sem dentes expelia uma baba esbranquiçada e purulenta.
        Seu hálito era de um fedor tremendo.
        Mas podia-se dizer que a Morte estava feliz e contente.
        Ela estava até cantando!
        Pudera, tendo ceifado tantas vidas
        e tendo tantas outras para extinguir.
        Mas o canto da Morte era tão cavernoso e desafinado
        que os passarinhos que ainda sobreviviam
        silenciavam como se fossem mudos brinquedos de pedra.
        O canto da Morte, se é que podemos chamar aquele ruído de canto,
        era tão desconfortável e medonho
        que os cachorros esqueléticos uivavam feito loucos
        e os gatos magrelos bufavam e se arrepiavam todos.


        

Nesse momento, numa curva do caminho,
        enquanto um dos irmãos ficava escondido,
        o outro saltou do mato para a estrada,
        a poucos passos da Morte.
        Saltou com seu tambor mágico,
        que tocava sem cessar, com muito ritmo.
        Tocava com toda a sua arte, todo o seu vigor.
        Tocava com determinação e alegria.
        Tocava bem como nunca tinha tocado antes.
        A Morte se encantou com o ritmo do menino.
        Com seu passo trôpego, ensaiou um dança sem graça.
        E lá foi ela, alegre como ninguém,
        dançando atrás do menino e de seu tambor,
        ele na frente, ela atrás.
        
        O espetáculo era grotesco,
        a dança da Morte era, no mínimo, patética.
        Nem vou contar como foi a cena:,
        cada um que imagine por conta própria.
        E é bem fácil imaginar.
        Bem; lá ia o menino tocador
        e atrás ia a Morte.
        Passou-se uma hora, passou-se outra e mais outra.
        O menino não fazia nenhuma pausa
        e a Morte começou a se cansar.
        O sol já ia alto, os dois seguiam pela estrada afora,
        e o tambor sem parar, tá tá tatá tá tá tatá.
        O dia deu lugar à noite
        e o tambor sem parar, tá tá tatá tá tá tatá.
        E assim ia a coisa, madrugada adentro.
        O menino tocava, a Morte dançava.
        O menino ia na frente, sempre ligeiro e folgazão.
        A Morte seguia atrás, exausta, não agüentando mais.
        "Pára de tocar, menino, vamos descansar um pouco",
        ela disse mais de uma vez.
        Ele não parava.
        "Pára essa porcaria de tambor, moleque,
        ou hás de me pagar com a vida",
        ela ameaçou mais de uma vez.
        E ele não parava.
        "Pára que eu não agüento mais", ela implorava.
        E ele não parava.
        
        
TAIÓ e Caiandê eram gêmeos idênticos.
        Ninguém sabia diferenciar um do outro,
        muito menos a Morte, que sempre foi cega e burra.
        Pois bem, o moleque que a Morte via tocando na estrada sem parar
        não era sempre o mesmo menino.
        Uma hora tocava 
Taió, enquanto Caiandê seguia por dentro do mato.
        Outra hora, quando 
Taió estava cansado,
        
Caiandê, aproveitando um curva da estrada, substituía o irmão no tambor.
        
Taió entrava no mato e acompanhava a dupla sem se deixar ver.
        No mato o irmão que descansava podia fazer xixi,
        beber a água depositada nas folhas dos arbustos,
        enganar a fome comendo frutinhas silvestres.
        Os gêmeos se revezavam e a música não parava nunca,
        não parava nem por um minuto sequer.
        Mas a Morte, coitada, não tinha substituto,
        não podia parar, nem descansar, nem um minutinho só.
        E o tambor sem cessar, tá tá tatá tá tá tatá.
        Ela já nem respirava:
        "Pára, pára, menino maldito."
        Mas o menino não parava.
        E assim foi, por dias e dias.
        Até os urubus já tinham deixado de acompanhar a Morte,
        preferindo pousar na copa de umas árvores secas.
        E o tambor sem parar, tá tá tatá tá tá tatá,
        uma hora 
Taió, outra hora Caiandê.
        
        Por fim, não agüentando mais, a aparição gritou:
        "Pára com esse tambor maldito
        e eu faço tudo o que me pedires."
        O menino virou-se para trás e disse:
        "Pois então vá embora e deixe a minha aldeia em paz."
        "Aceito", berrou a nauseabunda, vomitando na estrada.
        O menino parou de tocar e ouviu a Morte dizer:
        "Ah! que fracasso o meu.
        Ser vencida por um simples pirralho."
        Então ela virou-se e foi embora.
        Foi para longe do povoado, mas foi se lastimado:
        "Eu me odeio. Eu me odeio."
        Só as moscas acompanhavam a Morte,
        circundando sua cabeça descarnada.
        
        Tocando e dançando,
        os gêmeos voltaram para a aldeia
        para dar a boa notícia.
        Foram recebidos de braços abertos.
        Todos queriam abraçá-los e beijá-los.
        Em pouco tempo a vida normal voltou a reinar no povoado,
        a saúde retornou às casas e a alegria reapareceu nas ruas.
        Muitas homenagens foram feitas aos valentes Ibejis.
        
        Mesmo depois de transcorrido certo tempo,
        sempre que 
Taió e Caiandê passavam na direção do mercado,
        havia alguém que comentava:
        "Olha os meninos gêmeos que nos salvaram."
        E mais alguém complementava:
        "Que a lembrança de sua valentia
        nunca se apague de nossa memória."
        Ao que alguém acrescentava:
        "Mas eles não são a cara do Adivinho?"




quarta-feira, 20 de abril de 2011

UM PEQUENO DESABAFO !!!1

A responsabilidade nao está na idade mais sim na cabeça, criticas ja nao me abalam, elogios me dão forças pra continuar...  


Se todos que falassem mal de mim soubessem o que eu penso sobre eles, falariam mais ainda, Enquanto eles perdem tempo com isso, eu alcanço meus objetivos. Se me ama, junte-se a mim, se me odeia, junte-se a FILA!!! "fico perto dos amigos, e mais perto ainda dos inimigos"... Aliás, eu não tenho inimigos, apenas concorrentes que gostariam de ser como eu sou e fazer o que eu faço, por isso me odeiam tanto e tentam invejar minha imagem... eu apenas lamento, pois ainda ñ fiz um terço do q sou capaz!!! A minha atitude depende da sua... 


BABALORISÁ NINO D'ODÉ.


MÓ JÙBÁ.

AKOBÁ ESÚ !!!!!

MÓ JÙBÁ A TODOS MEUS AMIGOS, IRMÃOS, FILHOS E SIMPATIZANTES ......


VENHO INFORMAR A TODOS QUE NO DIA 23/04 SABADO AGORA (SABADO DE ALELUIA)
SERÁ REALIZADA A FESTA DO SR. DESTRANCA TUDO, ESÚ DE MEU BABALORISÁ, EM SEU PRÓPRIO ILÉ - CASA DE CULTURA AFRO BRASILEIRA ODÉ OJÚ OMÍN, EM OSASCO SP,


CLARO QUE ESTAREI PRESENTE .....


SINTAN-SE CONVIDADOS, MAIORES INFORMAÇÕES SÓ ME PROCURAR OK.


ABRAÇOS E UM BOM DIA A TODOS VCS


ADUPÉ.

BOM DIA !!!

Aproveite tudo que puder a cada hora, cada dia e cada época da vida.
 Assim você poderá olhar para frente com confiança e para trás sem ressentimentos.
 Seja você mesmo, mas dê o melhor de você!
 Atreva-se a ser diferente e seguir sua própria estrela…
 E nunca tenha medo de ser feliz!
  

quinta-feira, 14 de abril de 2011

ENTREVISTA

MINHA CONTRIBUIÇÃO PARA O TCC DO OMORISÁ DE UMA GRANDE AMIGA MINHA, ESPERO TER SIDO VERDADEIRO NAS RESPOSTAS E TER EXPRESSADO DE MANEIRA CLARA E OBJETIVA, A QUEM POSSA INTERESSAR SEGUE O QUESTIONAMENTO ABAIXO,


ABRAÇOS.




PESQUISA PARA PARA TCC.

Pesquisa:

Minha pesquisa tem como objetivo mostrar a falta de opção que nós temos de informações e programas referente as Religiões Afro-Brasileira (Umbanda, Candomblé, Batuque etc). Também pretendo mostrar que na televisão quando se fala do assunto é de forma pejorativa e preconceituosa. É importante pesquisar esse tema uma vez que nós povo de santo sofremos ataques e preconceitos quanto a religião e cultura que escolhemos para as nossas vidas e conhecendo a Constituição Federal, no artigo 5º, VI, que estipula ser inviolável a liberdade de consciência e de crença, assegurando o livre exercício dos cultos religiosos e garantindo, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias pretendo mostrar o não cumprimento da lei por parte de religiões cristãs e tentar levar a frente esta discução para possível debate na Universidade de Santo Amaro - UNISA a qual me da o direito de apresentação de temas e projetos de meu interesse. 

Com tudo aguardo a ajuda sincera e honesta de quem puder ajudar,


Dados básicos:

Nome completo: Thiago S. Silva ( Babalorisá Nino D’Odé )
 sexo: Masculino
cor: Moreno claro
Cidade de residência: Praia Grande
Religião: Candomblé Nação KETU.

Questionário:

Conte um pouco de sua vida antes de entrar na religião, se já passou por alguma outra religião pode contar também pois quanto mais informação melhor;

Sempre fui dedicado a espiritualidade, nasci e cresci dentro de terreiro de Umbanda na qual minha avó paterna é zaladora até hoje, aprendi desde novo cultuar e a zelar pelos mandamentos espiritualistas, nesse meio tempo houve a separação de meus pais, sem entender muito e pelo motivo da separação me desliguei da religião, procurando a igreja evangélica AVIVAMENTO DA FÈ onde me tornei levita e assim tocava nos acordes na igreja, sempre com o lado espiritual muito aguçado era levado em diversas igrejas para orar por revelação e louvar os hinos, até que um dia o pastor me convocou junto com meus responsáveis (por eu ser menor) e pediu que procurasse um local para me cuidar devido meu dom ser muito forte e que assim fugia do entendimento deles, daquele momento em diante nunca mais procurei a igreja; Em um domingo ao visitar a casa de minha avó estava tendo uma festividade de caboclo, ao adentrar não me recordo de absolutamente nada, segundo as pessoas presentes contam que uma entidade chamada caboclo PENA AZUL tinha dominado o meu corpo, deu o nome dele e permaneceu ali por algum tempo, devido a essa experiência e muitas outras nunca mais sai da religião, procurei uma casa de candomblé e com 13 anos de idade fui iniciado ao culto de Odé, orixá que rege meu Orí.

Qual o lado positivo e o lado negativo da religião?

O lado negativo de qualquer religião hoje em dia é o charlatanismo, falta de pessoas qualificadas para exercer funções dentro da religião, essas pessoas que talvez por falta de fé ou por falta de experiência fazem a má visão que todos vêem pelos meios de comunicações entre outros, outro ponto acredito ser o fanatismo, o fanatismo torna as pessoas egoístas, achando que são donas da razão e que podem fazer uma lavagem cerebral nas pessoas, religião é um tópico delicado, cada pessoa tem de sentir no seu mais intimo a necessidade e o conforto em estar em tal crença, a religião orisá tem sua cultura, sua história, sua ênfase; o importante é que ainda temos pessoas que fazem a boa fé, que dedicam suas vidas ao bem comum, ajudando os necessitados, auxiliando as pessoas de pouca fé, exercendo trabalhos sociais, procurando a melhoria de si e das pessoas que o cercam, isso sem dúvida torna-se primordial o lado positivo da religião.

O que te motiva a continuar na religião?

O que mais me motiva a continuar na religião primeiro é o amor que tenho pelo meu Orisá, depois a necessidade que tenho em ajudar as pessoas, hoje vivemos em um mundo doente, carente, vemos tantas drogas, filhos matando pais e vários outros motivos, que tocam meu coração a continuar acreditar que a fé faz a diferença nas pessoas, e para despertar essa fé temos de ter sacerdotes que queiram acreditar em um mundo melhor.

O que é a questão do orixá pra você?

Orisá no meu ponto de vista, é a natureza, é a pureza, é o mar, é o ar, é o fogo, é a fé, orisá é tudo que nos cerca, é o amor em primeiro lugar, é a missão que dedicamos a nós mesmos em ajudar, sempre digo que, para amarmos orisá temos de primeiro de tudo amar nossos pais respeitar e cuidar, porque: quem não ama e não respeita sua mãe, por exemplo, como poderá amar orisá ? ter fé e querer caminhar com orisá, é deixar os vícios mundanos, é largar de lado a promiscuidade e se dedicar a uma vida melhor.

Conte um pouco da abertura de sua casa de ilê e/ou umbanda;

Sou herdeiro de um ilê asé, na qual tomei posse no ano de 2007, onde no mesmo ano me filiei como presidente espiritual e sacerdote religioso da religião matriz africana na União de Tendas de Umbanda e Candomblé do Brasil, presidida por Jamil Rachid. Eu aos 15 anos fui apresentado como Babakekere do ilê, sendo considerado na cidade de Osasco o Pai-Pequeno mais jovem sendo homenageado pela federação do Falecido Sr. Furlan, assumi meu posto e aos 20 anos de idade após ter tomado meu OYÊ assumi o Cargo de Babalorisá do Ilé Asé situado na cidade de Osasco. Assumi a casa de candomblé sabendo da responsabilidade e da intolerância religiosa que sofremos, mas continuo sendo verdadeiro e ético acreditando que um dia teremos vitoria sobre a ignorância dos não adeptos; a maior ignorância é não ser capaz de respeitar a diversidade religiosa e cultural de um país como o nosso.



Quanto a mídia, quando você procura informações sobre a religião, qual é o melhor meio de comunicação pra se encontrar;

O melhor meio na minha opinião é seguir suas raízes, conversar com os mais velhos, ter a humildade de procurar entender e saber com seus zeladores de orisás, hoje temos muitos meios como a INTERNET por exemplo, nem sempre o que vemos na internet é a realidade da religião, a comunicação virtual ensina muito, mas eu acredito que o verdadeiro aprendizado esta no dia-a-dia dentro da roça de santo, aprendendo com os mais velhos, vendo como realmente é a historia da religião no decorrer da vida espiritual, os meios que temos hoje é o ponto fundamental do charlatanismo, pois com a facilidade de encontrar assuntos diversos faz com que as pessoas não necessitem ter tempo e idade de santo para poder ensinar, qualquer um hoje em dia pode se passar como sacerdote, e fazer vidas inocentes errar em acreditar no erro.

Você considera que a televisão brasileira mostra a religião de maneira pejorativa?

Com toda certeza, vemos na televisão variações de placas evangélicas que pregam diariamente suas tradições, vemos também o catolicismo agindo entre outras, mas e a religião orisá ??? vemos raramente trechos em novelas e mesmo assim mostram de maneira ignorante, mostra o feiticeiro fazendo maldade ou trabalho para o amor, é complicado, na realidade falta mostrar a tradição, falta mostrar que a religião afro-descendente tem a ver com a história do Brasil, é uma das religiões mais velhas, tem de mostrar os ritos dos índios que ocupavam nosso país, mas ainda precisamos nos unir cada vez mais para fazer com que esses temas aflorem nos meios de comunicações existentes.

Você já viu sua religião ser atacada na tv e/ou rádio?

Sim, varias vezes, sofremos essa ignorância diariamente nos meios de comunicações, pastores fazendo exorcismos e usando nomes de entidades, mostrando de maneira errante os trabalhos que são entregues em matas cachoeiras e encruzilhadas, ataques diretos nos chamando de feiticeiros, filhos das trevas entre outros.

Qual o melhor canal pra se ver algo da religião se existir é claro.

Melhor canal é conhecer a religião de perto, observar, analisar e sentir na pele o que é amar a religião, procurar ser um entendedor ativo sobre os nossos direitos legais, ser um bom filho para um dia ser um bom pai.

Você considera que a tv apenas estimula o preconceito ao invés de amenizá-lo?

Depende da matéria que esta sendo estudada, se for uma matéria coerente com a doutrina a hábitos com certeza vai ser amenizar o preconceito, graças a Olodumaré e as Orisás temos pessoas que já fazem esse trabalho na mídia, agora se for por outro lado, na qual vemos 95% estimula sim o preconceito.


 Já sofreu preconceito quanto a religião? conte;

Sim varias vezes, mas um caso que posso contar aqui, é de um pastor que abriu uma igreja evangélica a mais ou menos 5 casas na lateral de meu Ilé, sendo meu ilé como disse em uma das questões acima, uma casa de herança, tendo 30 anos de fundada, durante um domingo eu estava tocando para Boiadeiro e no findar do toque, eu já estava descansando quando chamaram, um filho de santo foi atender, voltou e me chamou disse que o pastor da igreja queria falar comigo, prontamente eu fui atende-lo, perguntei no que eu podia ajudar, ele me pediu para fazer menos barulho, disse que eu perturbava ele durante o culto, que os atabaques prejudicava no decorrer da palavra santa e tudo mais, falou que eu fazia ato satânico e varias outras coisas, vendo o pastor exaltado me observando como se eu fosse a pior pessoa do mundo, respondi educadamente; meu amigo o senhor fundou essa igreja a pouco tempo, quando o senhor chegou aqui eu já estava, e antes de mim muitas outras pessoas cultuavam aqui nesse mesmo local, eu faço menos barulho sem problema nenhum, se firmarmos um trato aqui, com a aceitação dele eu expliquei, expulse menos espíritos que buscam uma palavra na sua igreja, porque eu também me canso de auxiliar os problemas que o senhor poderia resolver la dentro mesmo, da mesma forma que o senhor tem direito de pregar o evangelho na praça e o padre fazer a procissão dele eu tenho direitos legais que me permitem fazer uma entrega na encruzilhada e tocar o meu tambor, e a mesma lei do barulho o senhor se enquadra. Hoje eu passo na rua e o mesmo pastor que veio me acusar me cumprimenta e me respeita, temos de agir não com medo de quem nos ofende,  temos de saber nos portar e falar e gritar chega a intolerância religiosa.



Eu Babalorisá Nino de D’Odé, agradeço imensamente a oportunidade de responder as questões a mim solicitadas, agradeço a Deus e a Orisá, e deixo uma frase para reflexão de todos:


 "A Umbanda e o Candomblé sobrevive até hoje porque não quer convencer as pessoas sobre uma verdade absoluta, ao contrário da maioria das religiões" (Pierre Verger)

Obrigado, Nino.






Grato desde então,

Allan Cassim
ignorância é não ser capaz de respeitar a diversidade religiosa e cultural de um país como o nosso...







TERREIRO DO COBRE-SALVADOR-BAHIA

Situado numa posição estratégica de Salvador, entre o centro da cidade e bairros tradicionais como Rio Vermelho e Ondina, o bairro da Federação é dono de algumas marcas bastante interessantes. Lá temos a maior concentração de emissoras de tevês e rádios e as primeiras e maiores universidades da cidade. É na Federação também que vamos encontrar a maior concentração de terreiros tombados como patrimônio nacional. Estes terreiros se estabeleceram por razões similares. Adeptos da religião garantem que foram três as prováveis razões para a concentração: mata virgem, perseguição policial e, em alguns casos, questões familiares.
Terreiros como a Casa Branca, Gantois, Ilê Oxumaré, Cobre e o Terreiro do Bogum que, segundo Lindinalva Barbosa, 42 anos, representante da Fundação Cultural Palmares na Bahia e sacerdotisa do Cobre (que na década de 1850 chegou a fazer parte da revolta dos Malês), juntos somam mais de 400 anos de história. Estes espaços sagrados, criados pelos negros escravos recém chegados a Bahia, trazidos pelos navios negreiros, se constituíram como local de integração sociocultural, fortalecendo e servindo como núcleo de relações familiares, religiosas e culturais do seu distante continente natal.

Impedidos de cultuar as divindades negras, os orixás, e ao mesmo tempo obrigados a participar das manifestações religiosas da igreja católica, três irmãs negras e escravas deram início nos fundos da atual Igreja de Nossa Senhora da Barroquinha, à tradição religiosa que mais tarde viria a ser chamada de candomblé, explicou o professor Antoniel Bispo, 59 anos, diretor secretário da Federação Nacional de Cultos Afros Brasileiros.
Quem hoje transita pela extensa Avenida Cardeal da Silva, cortando todo o bairro da Federação, percebe a imensa selva de pedra erguida por moradores provenientes de diferentes regiões. Paisagem bastante diferente da existente em meados do século XIX. “Por volta da década 1850, perseguidos pelo delegado que ficou conhecido na história como Pedrito, os poucos terreiros já existentes na cidade, foram obrigados a buscar uma região distante do centro e das pessoas da sociedade da época, que viam na prática religiosa uma conduta dos maus modos. Sendo assim, a região da Federação, conhecida na época como Mata-Escura, devido à densa mata existente na região, e já habitada por alguns terreiros, foi aos poucos sendo escolhida para ser o local de fundação de outros tantos terreiros inclusive de nações diferentes”, explicou Marcos Rezende, 29 anos, ogã do terreiro Oxumaré. “Por seu difícil acesso, atendido apenas por uma única linha de bonde, a linha 15, a Federação acabou sendo um local ideal para a fundação de novas casas, além de ficar longe da cidade e das perseguições da lei da vadiagem”, pontua Rezende.
“Alguns negros que praticavam o culto do candomblé, principalmente as manifestações cantadas ou tocadas, eram perseguidos por simplesmente se enquadrarem nos perfis criados pela lei. Pedrito, oficial da polícia baiana, avesso à manifestação religiosa e resguardado pela legislação estadual, era encarregado de fazer as perseguições, juntamente com uma grande equipe de guardas municipais. Eram nos dias de festas, que ele mais fazia sua perseguição. Os negros eram avisados da chegada do oficial, pelo militares, simpatizantes do candomblé ou até mesmo sacerdote de alguns dos terreiros perseguidos, que logo tratavam de interromper as festas”, lembra Rezende. Foi assim durante muito tempo. Preocupado com esta situação a Casa Branca e o próprio Oxumaré, dois dos mais antigos terreiros da cidade, buscaram na região a saída para realizarem sua atividade em tranqüilidade, completa o ogã.
Ainda para Marcos, que não acredita ter tido uma data precisa que marque sobretudo a abertura da primeira casa, devido ao fato de que nesta época as tradições serem transferidas oralmente, outro fator que contribuiu para a permanência e instalação de novos terreiros na atual localidade se deu por conta dos benefícios naturais existentes nas novas terras. Os terreiros precisam de folhas, plantas e uma fonte de água, elementos sagrados para o candomblé, e tudo isto foi encontrado em abundância nas imediações do Engenho Velho da Federação, sem esquecer do imenso e vizinho Dique do Toróro, onde se podia ir a pé fazer as oferendas sagradas.

Nações unidas

Localizado também no Engelho Velho da Federação, o Terreiro do Cobre é também um dos mais antigos e tradicionais da Bahia. Sua história remonta a 1889, quando, vindo de um outro ponto da Barroquinha, transferiu-se para o então Engenho Velho de Cima, permanecendo até os dias de hoje, define Lindinalva. Ainda no século XIX, o Cobre passou a ser dirigido pela Iyalorixá Flaviana Maria da Conceição Bianchi, filha da fundadora do Terreiro. “O Cobre tem uma particularidade que não encontramos nas outras casas. Por tradição do Terreiro, somente os descendentes consangüíneos podem dirigir espiritualmente a casa. Por esta razão a casa ficou muito tempo fechada, voltando a reabrir somente quando Mãe Valnizia de Ayrá, conhecida como Mãe Val, aceitou assumir o posto que de herança era dela, pelo fato de ser a única da hierarquia familiar com capacidade de direção”, explica Lindinalva.
Outra característica particular do Cobre é a de ser um dos únicos Terreiros a ter em seus costumes manifestações de origens das três principais nações da religião do candomblé no Brasil: ketus, bantos de Angola e gêges. “As nações definem as origens das tradições africanas dos terreiros no Brasil”, explicou Lindinalva.
Segundo o professor Antoniel, todo filho de santo é obrigado por um período a permanecer na casa de sua iniciação. Quando saíam, devido ao tempo que passavam em convívio com as pessoas e com o próprio espaço sócio-urbano, acabavam por se estabelecerem próximo às casas de origem. Ainda para o professor a questão dos terreiros na Bahia é uma questão social. É então que a relação familiar passava a determinar a fundação das novas casas.
Todos os terreiros existentes hoje na Federação praticamente foram fundados a partir de filhas e filhos-de-santo destes outros terreiros mais antigos, destaca a representante do Cobre. “Existem duas formas de um filho de santo abrir uma casa: a primeira é, tendo no mínimo sete anos de iniciação, solicitar uma espécie de autorização para iniciar seus trabalhos em um novo terreiro. Outra forma, mais praticada, é através do jogo de búzios, onde através de uma indicação a filha ou filho-de-santo recebe seu decá, podendo assim criar sua nova família”, explica Lindinalva.

Atividades socioculturais

Com tantos espaços de preservação cultural existentes na Federação, os moradores passam a desfrutar de benefícios exclusivos. Segundo o ogã Marcos, os moradores da Federação contam com diversos cursos e oficinas profissionalizantes gratuitos. Terreiros como Casa Branca, Oxumaré e o Cobre, juntos são responsáveis por realizarem oficinas práticas, graças ao apoio do Governo Federal, que vão desde os cursos de folhas, ensinando os jovens a conheceram os poderes existentes na natureza através de suas árvores e plantas sagradas até cursos de tecnologia como internet e computação. “Os vizinhos são privilegiados, por uma razão muito simples: transporte. Muitos deles não têm dinheiro para pagar a condução de vir para o terreiro, e isto seguramente iria contribuir para forçar uma evasão das salas de aula”, completa Marcos.
Em cada casa um segredo
Em 1851, a cidade do Salvador iniciava sua discreta expansão urbana, relembra Antoniel. “O presidente da Província da Bahia, Francisco Gonçalves Martins – Visconde de São Lourenço – iniciou a urbanização da Barroquinha, removendo o reduto africano para terraplanagem de toda a área. É deste modo que por volta de 1855, fugindo da urbanização e buscando um local de mata, elemento vital para o orixá, surge no Engenho Velho da Federação, exatamente na Avenida Vasco da Gama, o primeiro terreiro de candomblé da Bahia”, relata Bispo. “O terreiro da Casa Branca do Engenho Velho da Federação, Ilê Axé Iyá Nassô Oká, teve uma particularidade, nasceu com três titulares, as irmãs Iyá Dêtá, Iyá Kalá e Iyá Nassô. É a primeira casa de candomblé do Brasil, seguido do terreiro do Gantois, fundado pela Iyá Nassô, já batizada na Bahia”.
Preocupados com mudanças que pudessem causar alterações significativas na estrutura cultural, o poder público criou a lei federal nº. 6.292 de 15/12/1975 protegendo os terreiros de candomblé no Brasil, contra qualquer tipo de alteração de sua formação material ou imaterial. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) e o Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC) são os responsáveis pelo tombamento das casas. Na Federação, as principais casas já estão tombadas.

(junho de 2005)